Em decisão unânime no dia 22 de outubro, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou um recurso da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) que buscava a incidência de Imposto de Renda (IR) sobre doações de bens e direitos realizadas como adiantamento de herança. A decisão, proferida no Recurso Extraordinário (RE) 1.439.539, manteve o entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que havia afastado a cobrança de IR sobre a doação em questão.
Ao analisar o caso, o relator, ministro Flávio Dino, destacou que, conforme a jurisprudência do STF, o fato gerador do Imposto de Renda é o acréscimo patrimonial efetivo do contribuinte. No entanto, em casos de antecipação de legítima — quando o doador repassa parte de seus bens a herdeiros ainda em vida — ocorre uma redução patrimonial do doador, e não um acréscimo. Portanto, não há justificativa para a cobrança de IR, pois o ganho de capital, que constituiria o fato gerador do imposto, não se realiza no patrimônio do doador.
Ademais, o ministro ressaltou que a Constituição Federal evita a bitributação ao reservar a competência para incidência do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) aos Estados sobre transferências patrimoniais não onerosas, como heranças e doações. O ministro Luiz Fux, em voto-vista, acompanhou o relator, e os demais ministros reafirmaram seus votos proferidos anteriormente.
A PGFN argumentou que o imposto deveria incidir sobre a diferença entre o valor de mercado do bem no momento da doação e o valor de aquisição original pelo doador, considerando que esse “acréscimo patrimonial” configuraria ganho de capital. Contudo, o STF afastou essa interpretação, apontando que, na transmissão de patrimônio por doação, a operação não representa acréscimo de renda, pois não há aumento na riqueza do doador. A doação, sendo um ato não oneroso, se caracteriza como um negócio jurídico gratuito, o que, por definição, não gera o fato gerador necessário para o IR.
O precedente firmado pelo STF reforça as práticas de planejamento sucessório, como a criação de holdings familiares, nas quais os bens são transferidos aos herdeiros por meio de cotas de participação não onerosas. Essa estrutura permite organizar a partilha de bens sem caracterizar aumento patrimonial ao doador, viabilizando uma sucessão menos conflituosa e mais eficiente, ainda que o tema continue sob análise do Judiciário.
A decisão salienta a importância de se respeitar os limites de competência tributária, garantindo que o IR incida apenas sobre fatos geradores previstos em lei, como rendimentos e ganhos de capital.
Ao afastar a cobrança do IR sobre o adiantamento de legítima, o Supremo protege o contribuinte contra interpretações tributárias ampliadas e fortalece a segurança jurídica em planejamentos familiares, ao estabelecer que tais operações devem estar sujeitas exclusivamente ao ITCMD, conforme a legislação tributária vigente.
Uma questão que pode surgir é sobre a apuração do lucro na alienação dos bens recebidos em doação, no caso de o donatário decidir aliená-los no futuro. De acordo com a legislação tributária vigente, o custo de aquisição para fins de apuração do lucro imobiliário (ou ganho de capital) será o valor constante da declaração do doador no momento da doação. Isso significa que, ao calcular o lucro da alienação, o donatário deverá considerar o custo histórico (custo original de aquisição do bem pelo doador) e não o valor de mercado atribuído no momento da transferência.
Essa regra reflete a orientação de que o ganho de capital somente é tributado efetivamente quando ocorre uma alienação onerosa e um aumento patrimonial em favor do proprietário, nesse caso, o donatário.
Portanto, o STF não reconhece ganho de capital ou aumento patrimonial em doações gratuitas de bens, sendo a tributação do IR aplicável somente quando o donatário aliena os bens de forma onerosa e com efetivo ganho.
O entendimento firmado pelo STF no Recurso Extraordinário (RE) 1.439.539 representa um avanço significativo na segurança jurídica sobre a tributação de doações não onerosas, especialmente em contextos de planejamento sucessório. Com essa decisão, o Supremo Tribunal Federal orienta o tratamento jurídico e fiscal para as transferências de bens em vida, protegendo o contribuinte contra interpretações que poderiam resultar em cobranças indevidas de IR.
A jurisprudência estabelecida reafirma a competência exclusiva dos Estados para tributar essas doações por meio do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), confirmando a inaplicabilidade do IR sobre doações realizadas em adiantamento de herança.
Entretanto, o precedente da 1ª Turma no RE 1.439.539 contrasta com o entendimento da 2ª Turma, manifestado no julgamento do RE 1.425.609, que validou a incidência do IR sobre o ganho de capital em transferências patrimoniais gratuitas. Essa divergência evidencia a necessidade de uma análise pelo Plenário para unificar o entendimento e assegurar uma jurisprudência consistente sobre a questão.
Diante disso, a controvérsia permanece e a questão da incidência do IR sobre doações e heranças segue em aberto.
É crucial, portanto, acompanhar futuros posicionamentos do STF, uma vez que a consolidação de uma jurisprudência única e estável trará maior segurança aos contribuintes em seus planejamentos patrimoniais e sucessórios.
Alertamos que este material foi elaborado para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico. A Equipe de Direito Tributário do Gomes Altimari Advogados se mantém à disposição para fornecer os esclarecimentos que se fizerem necessários.
Edenilson Nunes Freitas – edenilson@gomesaltimari.com.br