Em breve síntese, o novo Decreto nº 10.854/2021, chamado de Marco Regulatório Trabalhista Infralegal, regulamenta disposições relativas à legislação trabalhista, além de instituir o Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas Infralegais, deliberando sobre os principais temas:
- Livro de inspeção do trabalho
Trata-se de um novo serviço eletrônico obrigatório que será disponibilizado para todas as empresas que possuam ou não empregados. De tal modo, será uma maneira de comunicação entre a empresa e a inspeção do trabalho, de forma eletrônica e em substituição ao livro impresso.
Todavia, a disponibilização do serviço ainda não tem uma data definida, a qual será estabelecida por ato do Ministro do Trabalho e Previdência, momento em que seu uso se tornará, de fato, obrigatório.
- Fiscalização das normas de proteção
Quanto à fiscalização das normas de proteção, o principal ponto é que o novo decreto traz a determinação de que a fiscalização do cumprimento destas cabe unicamente aos Auditores-Fiscais do Trabalho do Ministério do Trabalho e Previdência.
Por sua vez, denúncias quanto à infração das mencionadas normas deverão ser realizadas pelos trabalhadores através de canais eletrônicos, entidades públicas, privadas, sindicais e outros. Além disso, a estruturação da ordem de análise dessas denúncias se dará conforme a seriedade de cada caso. Assim, aquelas que versarem sobre risco à segurança do trabalhador, falta de pagamento de remuneração, trabalho infantil e escravo terão prioridade na apreciação.
- Certificado de Aprovação dos Equipamentos de Proteção Individuais – EPIs
Acerca dos EPIs, estes só poderão ser comercializados se possuírem o Certificado de Aprovação – CA. Tal documento é uma garantia do Ministério do Trabalho de que o produto atende às requisições do mercado.
Compete esclarecer que o CA deverá ser adquirido pela empresa que produz os EPIs. Todavia, o documento somente será emitido quando adotados os devidos procedimentos e requisitos técnicos, os quais serão dispostos por Ato do Ministro de Estado do Trabalho e Previdência.
Ainda, insta consignar que os autores de declarações ou informações falsas ou que apresentarem documentos falsificados acerca do CA ficam sujeitos às penas previstas nos artigos 297 a 299 do Código Penal, ou seja, reclusão entre 1 (um) e 6 (seis) anos, a depender de cada caso.
- Registro eletrônico e controle de jornada
O Novo Marco Regulatório juntamente com a Portaria/MTP nº 671/21 trouxeram disposições acerca do registro eletrônico de controle de jornada, classificados em três categorias: REP-C Registrador Eletrônico de Ponto Convencional; REP-A Registrador Eletrônico de Ponto Alternativo; e REP-P Registrador Eletrônico de Ponto via Programa.
Na realidade, foram conservadas as regulamentações anteriores sobre o tema, passando apenas a ficarem reunidas, simplificando a consulta à norma.
Nestes termos, REP-P permitirá aos empregadores a possibilidade de proporcionar aos seus empregados registradores de ponto com novas tecnologias, tal como anotação de ponto móvel, através do celular, por exemplo. Já o REP-C permanecerá existindo e atendendo estabelecimentos e produções permanentes/fixas. Ainda existe a possibilidade de se admitir a autocomposição na elaboração de sistemas REP-A, através de instrumentos coletivos de trabalho.
É de se destacar que os registros precisarão comportar a adequada identificação de empregado e empregador, além de dever viabilizar a remoção do registro fidedigno dos lançamentos feitos pelo empregado.
Por fim, os sistemas não permitirão alterações ou eliminação de dados registrados pelo empregado, restrições de horário às marcações e as marcações automáticas, como horários predeterminados ou inicialmente contratados, bem como haverá vedação à exigência de autorizações para o registro de sobrejornada, no entanto será permito a pré-assinalação do período de descanso, bem como o registro por exceção.
- Empresas prestadoras de serviços a terceiros
Sobre este tema, determina o decreto que não configurará vínculo de emprego entre trabalhadores/sócios de empresas prestadoras de serviços e empresa tomadora destes serviços. Tal assunto anteriormente só vinha sendo tratado em decisões judiciais e não por meio de norma, inovando, portanto, o decreto com a nova regra.
Contudo, é de se destacar que a empresa contratante ficará responsável pelas condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores quando o labor for realizado em suas dependências ou em local previamente convencionado em contrato.
Ainda, quanto à configuração de grupo econômico, o decreto veda seu reconhecimento quando embasado em mera identidade de sócios, sendo necessária a demonstração de interesse integrado; efetiva comunhão de interesses; e atuação conjunta das empresas integrantes do grupo econômico.
6. Gratificação de Natal
O novo decreto não apresentou mudanças expressivas ao pagamento do décimo terceiro salário, mas uniu normas que estavam esparsas em diferentes leis. Na prática, o decreto não afetará a rotina das empresas, que poderão seguir a mesma organização já utilizada para o pagamento da gratificação natalina.
A título de conhecimento, vale ressaltar que a legislação permite algumas estratégias para pagamento da respectiva verba, de modo a não sobrecarregar o caixa da empresa nos meses de novembro e dezembro.
Nesta toada, as empresas poderão pagar a primeira parcela do décimo terceiro salário entre os meses de fevereiro a novembro, podendo, ainda, escalonar o respectivo pagamento a determinados empregados ou setores, da forma que melhor atender à empresa, como, por exemplo, poderá adiantar a primeira parcela para o mês de aniversário do empregado, mas não precisará aplicar esse critério a todos os empregados.
Caso haja pagamento de remuneração variável, deverá ser calculada a média destas para integração do pagamento do 13º salário. No caso de pagamento de parcela variável em dezembro, a empresa tem até o dia 10 de janeiro do ano subsequente para recalcular a média do 13º, bem como efetuar o pagamento ou efetuar a compensação das respectivas diferenças.
Frisa-se que o empregado demitido por justa causa perderá o direito ao recebimento do 13º salário e, caso tenha recebido este adiantadamente, o valor poderá ser descontado de suas verbas rescisórias.
Vale lembrar que caso o empregador tenha efetuado o adiantamento gratificação natalina e seja extinto o contrato de trabalho antes do prazo do seu devido pagamento, a empresa poderá compensar os valores com as demais verbas rescisórias.
- Vale-transporte – VT
Estabeleceu-se que o empregador que proporcionar a condução adequada ao trabalhador para o percurso residência-trabalho e vice-versa aos seus trabalhadores fica desobrigado de fornecer vale-transporte.
No entanto, caso o empregador ofereça ao trabalhador condução que não abranja totalmente o percurso, o VT deverá ser fornecido aos trechos da viagem não compreendidos pelo mencionado transporte. Destaca-se que é vedado ao empregador substituir o VT por antecipação em dinheiro ou qualquer outra forma de pagamento, exceto ao empregador doméstico.
Insta consignar que o vale não possui natureza salarial, portanto não compõe base para INSS/FGTS, também não é considerado para cálculo do 13º salário e não é rendimento tributável.
Ressalta-se que a declaração falsa e o uso indevido do VT constituem faltas graves e ensejam justa causa.
- Programa Empresa Cidadã
O programa “Empresa Cidadã” visa prorrogar por 60 (sessenta) dias a licença-maternidade e por 15 (quinze) dias a licença-paternidade, através de incentivos fiscais aos empregadores.
Por sua vez, caso deseje tal prorrogação, a empregada deverá solicitá-la até o fim do primeiro mês após o parto. Sendo conferida, será gozada posteriormente à fruição da licença comum.
Já ao empregado que desejar prorrogar a licença-paternidade, a solicitação deverá ser feita até dois dias úteis após o parto. A concessão está sujeita à comprobação de participação em programa/atividade de orientação sobre paternidade responsável.
Ainda, é de extrema importância destacar que essas disposições também se aplicam aos adotantes.
Enfim, os empregados favorecidos com o programa, na data da prorrogação, com exceção de contratos de trabalho simultâneos consolidados antecipadamente, não poderão desempenhar atividade remunerada.
Compete esclarecer que a adesão ao programa Empresa Cidadã se dará através de requerimento dirigido à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia.
O respectivo programa possibilita às empresas dedução de imposto sobre a renda previstas no art. 648 do Decreto nº 9.580/18.
- Repouso Semanal Remunerado (RSR) e pagamento de salário em Feriado
É cediço que todo empregado possui direito a descanso semanal remunerado de 24 (vinte e quatro) horas contínuas, preferencialmente aos domingos e, nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, seguindo a tradição local. Desta maneira, a infração à concessão do RSR ou do respectivo pagamento nos termos abaixo alinhavados sujeita a empresa à multa.
De modo breve, por exigências técnicas entendem-se situações advindas em razão do interesse público ou de condições características das atividades da empresa ou do local onde opera, tornando imprescindível a ininterrupção do trabalho, seja em todo ou em parte.
Ademais, será obrigatório o repouso remunerado nos dias de feriados locais, até o máximo de quatro feriados, desde que declarados por lei municipal.
No entanto, quando admitido trabalho nos dias de descanso, a remuneração dos que laborarem nesses dias deverá ser pago em dobro, a menos que a empresa defina outro dia para repouso.
Ainda, o direito ao DSR poderá se perder caso o empregado, sem justo motivo ou por punição disciplinar, não desempenhar inteiramente sua jornada durante a semana.
- Relação Anual de Informações Sociais – RAIS
A Relação Anual de Informações Sociais é um relatório de informações socioeconômico requerido pelo Ministério do Trabalho e Emprego aos empregadores anualmente.
Assim, o decreto estabeleceu que a RAIS deverá ter elementos para suprir as necessidades de controle, de estatística e de informações das entidades governamentais da área social, e auxiliar no pagamento do abono salarial.
- Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT
Ainda, no novo decreto constam mudanças no Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) relativas ao vale-alimentação.
Por meio das novas regras estabelecidas, os trabalhadores poderão aproveitar o vale-alimentação em um número maior de estabelecimentos, vez que as operadoras contratadas pelo empregador precisarão admitir a interoperabilidade entre si e com os arranjos de pagamento abertos. Deste modo, o trabalhador não será limitado a uma rede que aceita exclusivamente determinado cartão do benefício.
Ademais, a flexibilidade de bandeira ainda oferecerá portabilidade gratuita do serviço de pagamento de alimentação ofertado pelo empregador.
De outro modo, às empresas, fica vedado exigir ou receber descontos em contratos oferecidos pelas operadoras do benefício, além de que não ser mais possível celebrar contratos com prazos que caracterizem compra pré-paga dos valores a serem disponibilizados aos trabalhadores.
Tais mudanças do PAT entrarão em vigor somente 18 (dezoito) meses após a data da publicação do decreto.
Cumpre destacar que a empresa beneficiária do PAT observará as regras de dedução de imposto sobre a renda, conforme o disposto nos art. 383, art. 641 e art. 642 do Decreto nº 9.580/18.
Este material foi elaborado para fins de informação e debate e não deve ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
Roberto Nicolau Schorr Junior (roberto.schorr@gomesaltimari.com.br)
Carolina Sechi Monteiro (carolina@gomesaltimari.com.br)