Depois de expandir seu portfólio de marcas de chocolates no Brasil com a aquisição da popular Garoto, a Nestlé acaba de dar outra tacada para aumentar essa carteira, agora no segmento premium. A companhia suíça oficializou a aquisição do controle do Grupo CRM, dono das marcas Kopenhagen, Brasil Cacau e Kop Koffee.
Num pré-feriado intenso, entre advogados, sócios e contratos, a Nestlé fechou a compra da participação que era detida pelo fundo de private equity Advent. Acionista minoritária à frente da gestão da Kopenhagen, Renata Moraes Vichi segue no negócio como sócia e executiva-chefe (CEO).
“Nestlé e Kopenhagen têm complementariedade em canais e negócios, marcas fortes, paixão por consumidores, mas nosso ‘approach’ é bem humilde. Sabemos que não conhecemos de franquias”, diz Marcelo Melchior, CEO da Nestlé no Brasil, ao Valor. “Temos butiques da Nespresso, mas não é o negócio ‘core’, não temos a experiência de manejar pontos de venda. Vamos aprender, entender, deixar a Renata fazer e brilhar.”
Segundo Vichi, a mensagem dos novos sócios é que, ainda que haja oportunidades a serem exploradas conjuntamente, não há pressa. “Vemos muito sinergia entre a CRM e a Nestlé, inclusive na cultura organizacional das companhias. Sou empreendedora, temos uma política expansionista, mas sou inflexível no posicionamento das nossas marcas e encontrei sócios que acreditam nesse meu dogma”, diz a CEO. “Seremos uma unidade autônoma, preservando os planos de Kopenhagen, Brasil Cacau e Kop Koffee. A Nestlé viu valor no plano que já tínhamos e entra para dar tração, sem agenda disruptiva, mas evolutiva.”
O canal de franquias continuará sendo o prioritário para a CRM. Nos últimos três anos, com a Advent como sócia, a CRM dobrou o número de lojas — o que, inicialmente, estava previsto para cinco anos. “Foram cinco lojas por semana neste ano”, diz Wilson Rosa, sócio da Advent, que faz mistério sobre o retorno do fundo.
Atualmente, são 1,1 mil lojas. Agora, o plano é triplicar até 2026, segundo a CEO, com pouco mais de 2 mil novas unidades já mapeadas no país. Apesar da presença internacional da Nestlé, levar a Kopenhagen para o exterior não está nos planos. “Tem muita oportunidade no Brasil”, diz Melchior.
No curto prazo, as companhias vão trabalhar muito mais “sinergias intelectuais”, segundo o CEO da Nestlé — como formas de trabalhar, foco na inovação, conhecimento do consumidor —, que podem chegar também a questões de contabilidade ou fábrica, mas não marcas ou canais.
A transação entre Advent e Nestlé avaliou a Kopenhagen em R$ 4,5 bilhões, considerando ações mais dívida, segundo fontes. As empresas não revelam cifras mas, segundo fonte, o grupo tem Ebitda anual na casa de R$ 250 milhões — o que representaria um múltiplo de 18 vezes para o valor da companhia. “É um múltiplo bem alto, mas esse não é o tipo de oportunidade que aparece toda hora”, avalia um banqueiro de investimento.
A Nestlé era apontada como uma das potenciais candidatas a um negócio que tem certa complexidade, ao unir indústria e rede de franquias. Ainda assim, depois do imbróglio da aquisição da Garoto, havia quem duvidasse do apetite da suíça para novas aquisições no Brasil e justamente em chocolate.
Mas, depois de perder a Mãe Terra para a Unilever, há seis anos, e ver a entrada recente da Ferrara Candy, do herdeiro da Ferrero Rocher, no Brasil com a aquisição da Dori, a companhia aumentou a disposição por novas transações de maior tamanho, disseram fontes. No ano passado, a companhia fez uma operação de menor porte, com a compra da Puravida, de alimentos saudáveis. A compra da Garoto foi há 20 anos.
A aposta vem no segmento que mais cresce. Segundo a consultoria Kantar, o mercado premium de chocolates avançou 22% no ano passado, enquanto o consumo de marcas populares caiu 12%. “É um movimento bastante positivo, posiciona a Nestlé como forte concorrente quando falamos de universo premium e deve reforçar muito a força da marca no consumo fora do do lar”, diz Bruno Machado, diretor de contas da Kantar na divisão de consumo.
O comprador avalia que a transação não terá empecilhos regulatórios. “O próximo passo é o processo de aprovação da operação. Existe todo um procedimento no Cade, não tem consulta prévia, são os filings costumeiros. Estamos muito confiantes”, diz Melchior.
Segundo fonte, há uma taxa de insucesso da Nestlé para Advent, conhecida como “break-up fee”, caso a transação seja barrada no Cade. As empresas não comentam.
O Pipeline, site de negócios do Valor, revelou em junho que a Advent tinha contratado o Goldman Sachs para buscar um comprador para sua fatia. Do lado da Nestlé, o assessor foi o banco UBS.
A Kopenhagen foi criada no fim da década de 1920 por um casal de imigrantes da Letônia, Anna e David Kopenhagen, e comprada pelo empresário Celso Ricardo de Moraes, pai de Renata Vichi, em 1996. Ela começou a se interessar pela empresa aos 16 anos, entrou como estagiária e passou por todos os departamentos. Na sua gestão, o negócio mudou de patamar.
O grupo CRM chegou a ter também uma sociedade com a Lindt no Brasil, mas a aliança foi desfeita. Segundo a CEO, todas as marcas do grupo CRM têm Ebitda positivo. (Colaborou Ana Luiza de Carvalho)
Fonte: VALOR ECONÔMICO