Não há violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa quando um ex-cônjuge não é citado para assumir a responsabilidade patrimonial de outro, já que a extensão é autorizada pela legislação.
Com esse entendimento, a 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a responsabilidade solidária de uma mulher por um dívida contraída pelo ex-marido há 20 anos, referente a mensalidades escolares que não foram pagas entre maio e dezembro de 2002, e janeiro e novembro de 2004.
A defesa da mulher alegou que ela não sabia da existência do débito e que parte significativa da dívida foi contraída pelo ex-marido após a separação judicial do casal, ocorrida em 2003. A defesa apresentou cópia da sentença que decretou a separação e atribuiu ao homem o pagamento das mensalidades dos filhos do ex-casal.
Assim, a mulher sustentou sua ilegitimidade passiva e disse que não haveria responsabilidade solidária pela dívida, justamente porque, no momento do divórcio, ficou acertado que o ex-marido pagaria a escola dos filhos. Apesar disso, o TJ-SP manteve a decisão de primeira instância que ordenou a penhora de cerca de R$ 246 mil da mulher.
Para o relator, desembargador Antonio Rigolin, a sentença proferida nos autos da separação, que eximiu a mulher de qualquer responsabilidade pelas mensalidades dos filhos, “nenhuma relevância tem para a análise da matéria, dado que sua eficácia não alcança a parte exequente, o que determina o prevalecimento da penhora”.
Assim, na visão do magistrado, o que se tem é, simplesmente, a possibilidade do exercício do direito de regresso da mulher em relação ao ex-marido. Conforme Rigolin, não há fundamento para cogitar a nulidade processual por ausência de citação, uma vez que a mulher não integra o processo, apenas o seu patrimônio é alcançado, ante a existência de responsabilidade, na forma do artigo 790, IV, do CPC.
“A recorrente não figura na relação obrigacional, mas é responsável. Isso faz com que o seu patrimônio fique ao alcance da execução, tal como ocorre com o executado. O terceiro, na verdade, não é citado, mas intimado da pendência do processo, cabendo-lhe a possibilidade de utilizar dos meios processuais próprios para questionar a constrição”, concluiu o relator. A decisão foi por unanimidade.
Segundo o advogado da mulher, José Luiz Parra Pereira, sócio do escritório Parra e Rudge Advogados, a decisão representa “verdadeira violação de princípios constitucionais de grande envergadura, como o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, caracterizando, ainda, afronta à própria legislação processual (artigo 73, §1º, CPC)”.
Pereira afirmou que sua cliente não foi citada ou intimada dos atos processuais, tomando conhecimento da dívida por meio do bloqueio de uma aplicação financeira de sua titularidade. Ele também disse que a decisão teria violado o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.444.511.
“A legislação exige o respeito a outras regras para a constrição do patrimônio de um e de outro cônjuge, dentre elas, a devida citação do cônjuge que não participou da relação contratual inadimplida (formação de litisconsórcio passivo necessário), bem como a análise concreta da entidade familiar, especialmente a existência de relacionamento conjugal na época em que contraída a dívida reclamada pelo credor, tendo em vista ser o casamento um fato jurídico que repercute de forma significativa no processo”, disse.
Processo 2037153-67.2022.8.26.0000
Fonte:https://www.conjur.com.br/2023-mar-07/mulher-responde-solidariamente-divida-ex-marido-tj-sp. Acesso em: 07/03/2023.