O FaceApp, aplicativo que usa inteligência artificial para transformar selfies de homem em mulher e vice-versa, além de mostrar como a gente vai ficar no futuro, voltou a ficar na moda no Brasil. Nos últimos dias, famosos e anônimos estão adorando o app e postando os resultados nas redes sociais. Mas, o FaceApp está cercado de polêmicas há anos.
O app é acusado de “roubar” seus dados por causa de sua política de privacidade. Além disso, já foi investigado nos Estados Unidos pelo FBI (o Departamento Federal de Investigação), já fez com que Apple e Google recebessem multas no Procon, foi chamado de racista por branquear fotos de pessoas negras e pode colaborar com o chamado “deepfake”.
Apesar de tudo isso, os brasileiros ainda curtem usar o app. Antes de saciar sua curiosidade sobre sua “versão no sexo oposto”, saiba mais detalhes das polêmicas em torno do aplicativo.
Pode “roubar” seus dados
Dependendo da interpretação, a política de privacidade e os termos de uso dariam à Wireless Lab, empresa russa responsável pelo app, a possibilidade de coletar alguns de seus dados, como:
- As fotos que são escolhidas pelo usuário
- A banda consumida pelo app
- O histórico de compras
- Informações de redes sociais (caso o login seja feito por outra plataforma)
- O modelo do celular Resolução da tela
- Tipo de sistema operacional
- Alguns dados de sua navegação online, como sites que foram visitados.
A política de privacidade foi atualizada no último dia 4 de junho. A empresa afirma que usa provedores de nuvem terceirizados —Google Cloud Platform e Amazon Web Services— para processar e editar as fotos.
Além disso, realiza o processo com criptografia dentro do celular, garante que só usa as fotos que o usuário escolhe e que elas ficam armazenadas na nuvem por um período de 24 a 48 horas, caso sejam necessárias mudanças dos usuários.
A Wireless Lab diz que essas informações são usadas para melhorar o app, direcionar anúncios e para prevenir fraudes. Também diz que os dados podem se tornar anonimizados, ou seja, sem informações pessoais que identifiquem o usuário.
Os termos de uso também dão à empresa uma licença livre de royalties para usar as fotos do usuário para fins publicitários, sem pedir autorização. Outra polêmica dos termos é dar à empresa a possibilidade de “processar, armazenar e transferir suas informações para outros países”, sem dar mais explicações sobre isso.
A empresa jura que, apesar de tudo, não compartilha informações com terceiros e que usa as fotos exclusivamente para o propósito do aplicativo. Vale lembrar que outras grandes empresas americanas de tec também coletam muitas coisas, como o Google e o Facebook, com promessas e avisos parecidos com os da Wireless Lab.
FBI investigou app e o criticou
Até o FBI entrou na história e investigou o aplicativo. O motivo foi uma carta enviada pelo senador americano Chuck Schumer, que pedia ao órgão uma investigação.
O FBI analisou os termos de uso do app e destacou que a Wireless Lab explora os mesmos dados dos celulares que as redes sociais também usam, com a diferença de que o FaceApp envia as fotos dos usuários para manipulação em servidores na nuvem.
O FBI também se mostrou reticente sobre a veracidade do que a empresa diz fazer.
“O FBI considera qualquer aplicação móvel ou produto similar desenvolvido na Rússia, como o FaceApp, como um risco potencial de contrainteligência, tendo como base os dados que o produto coleta, seus termos de uso e políticas de privacidade e os mecanismos legais disponíveis ao governo russo que permitem acesso a dados dentro das fronteiras russas”, diz o documento escrito em resposta a Schumer.
Procon já multou no Brasil
Em agosto do ano passado, a Fundação Procon de São Paulo multou o Google e a Apple por desrespeitarem o Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao fornecer o Faceapp.
As multas estipuladas foram de R$ 9.964.615,77 para o Google e de R$ 7.744.320,00 para a Apple. O aplicativo, no entanto, não foi multado. Na época, o Google disse que iria recorrer, enquanto a Apple não se manifestou.
O Procon havia notificado as duas empresas em busca de informações sobre como protegiam os dados dos consumidores. O órgão concluiu que elas violaram os direitos do consumidor brasileiro ao permitir que o FaceApp exibisse informações em inglês em sua “Política de Privacidade” e “Termos de Uso”.
A reportagem procurou Procon-SP, Google e Apple para obter uma atualização sobre o tema. As duas empresas ainda não pagaram a multa porque entraram com processos de defesa.
A defesa do Google não foi aceita pelo Procon, e a empresa apresentou recurso que está em análise —informação também confirmada pelo Google. A primeira defesa da Apple, segundo o Procon, também está sendo analisada pelo órgão. A Apple não respondeu à reportagem até o momento.
Já foi chamado de racista
O FaceApp já foi considerado racista. O aplicativo embranqueceu pessoas negras e indianas quando elas usavam um filtro que deveria “embelezá-las”. Recentemente, o pesquisador Tarcízio Silva, mestre em comunicação pela UFBA (Universidade Federal da Bahia), lembrou a história em seu Twitter.
A empresa teria alegado ao jornal The Guardian que o tal branqueamento era “um infeliz efeito colateral da rede neural subjacente causado pelo viés da base de dados para treinamento, não comportamento intencional”.
A Wireless Lab tirou o filtro do ar e pediu desculpas pelo ocorrido.
Pode ser usado para “deepfake”
O resultado final dos filtros do FaceApp é tão real que pode ser usado para enganar outras pessoas. Quem garante que a versão feminina de um homem não possa ser usada em um app de namoro, como o Tinder, para golpes?
Além disso, dá para usar no aplicativo uma foto de terceiros, como as imagens de famosos, e criar outros problemas com as imagens geradas. Até o papa Francisco já teve sua versão mulher criada pelo FaceApp.
Pode ser usado para reconhecimento facial
A Wireless Lab jura que não repassa as fotos para ninguém. Mas, por causa das brechas deixadas pelo termo de uso, ninguém pode garantir isso. Um dos perigos seria o da empresa vender as imagens dos rostos para empresas que podem usar as fotos para reconhecimento facial.
Além disso, como as imagens estão em servidores de terceiros, podem ser roubadas por cibercriminosos e até mesmo serem usadas para falsificação de documentos, conforme um alerta da empresa de segurança Kaspersky.
Fonte: Thiago Varella – UOL. Acesso em: 16/06/2020.