A exigência de cheque-caução para o pagamento de despesas hospitalares não previstas no contrato não gera por si só danos morais, decide 3ª turma do STJ.
O entendimento da turma foi proferido ao julgar recurso de autores que ajuizaram ação pedindo R$ 6 mil de danos morais. Para os recorrentes, a cobrança foi abusiva por exigir pagamento prévio em situação de fragilidade emocional. O hospital, por sua vez, reputou lícita sua conduta especialmente por ter prestado o serviço solicitado.
Em 1º grau o processo foi extinto sem resolução de mérito e, no 2º grau, o Tribunal a quo julgou improcedente o pedido formulado na petição inicial.
Novos olhares
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, ao abordar o tema do dano moral nas relações privadas de saúde suplementar, consignou que tais relações têm “despertado novos olhares na comunidade jurídica”.
Conforme a ministra, diante de cada conflito, deve-se estar atento às particularidades que o tornam único e irrepetível sem perder de vista o tratamento jurídico igualitário para circunstâncias semelhantes de outros conflitos.
“Na ímpar linguagem poética de João Guimarães Rosa “um sentir é o do sentente, mas outro é o do sentidor” (Grande sertão: veredas. 19 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001).
Sentir o que significa dano moral quando o único recurso é a linguagem jurídica torna-se um compromisso ético e, não por outro motivo, “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”, palavra de lei.”
Para a ministra, a consolidação de uma tese jurídica não pode se distanciar da realidade da vida.
Cobrança legítima
Especificamente acerca da exigência de cheque-caução na relação hospital-paciente, Nancy lembrou que o CP tipifica como crime a conduta de “exigir cheque-caução, notapromissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial” (lei 12.653/12).
Mais adiante, a relatora consignou que é preciso observar casuisticamente se houve abuso de direito na ação do hospital, seja pela cobrança de valores extorsivos, seja pelo constrangimento ilegal de pacientes e familiares quanto a tratamentos inadequados ou inúteis.
No caso concreto, analisou Nancy, a paciente foi acolhida pelo serviço de emergência hospitalar, o diagnóstico médico fornecido, indicado o tratamento correspondente, solicitada a cobertura pelo plano de saúde, assinado termo de responsabilidade hospitalar, disponibilizada ao consumidor a opção de pagamento particular pela cirurgia excluída pelo convênio, realizado o pagamento por meio de cheque caução e efetivamente prestado o serviço de atenção à saúde.
“O pagamento por cheque-caução como alternativa para a família ver concretizado o atendimento médico-hospitalar não ganhou contornos de uma aguda aflição capaz de agravar o quadro clínico da paciente, nem mesmo de embaraçar por conduta maliciosa o pagamento de quantia extorsiva do seu filho.
Conforme apontado pelo Tribunal de origem, a entrega do cheque-caução decorreu da opção livre e consciente, assim que teve ciência da negativa de cobertura do plano de saúde para o cateterismo cardíaco solicitado pelo médico assistente.”
Dessa forma, assegurou Nancy, a cobrança pela realização do procedimento (cateterismo) foi decorrente da legítima atividade médico-hospitalar prestada em favor dos consumidores.
Assim, negou provimento ao pedido dos recorrentes, pois entendeu que inexiste conduta ilícita do hospital que tenha produzido dano moral compensável. A decisão da 3ª turma foi unânime.
Processo: REsp 1.771.308
Fonte: Migalhas. Acesso em: 01/03/2019.