É possível a penhora do bem de família com restrições, reservando parte do valor, para que o devedor, ou terceiro que reside no local, possa adquirir outro imóvel. Assim decidiu a 12ª câmara de Direito Privado do TJ/SP ao observar que a solução assegura a dignidade da família do devedor, que reside no local desde 2001.
Trata-se de recurso oposto por uma mulher que reside em imóvel penhorado por conta de dívida de seu ex-marido. Nos autos, a autora alegou ser possuidora de 50% do imóvel penhorado, e que suas filhas possuem fração do imóvel de 25% cada uma. Defendeu que o imóvel se trata de bem de família, e por isso, é impenhorável.
O juiz de 1º grau acatou os argumentos da mulher e considerou a casa impenhorável. Segundo o juízo de piso, não se tratando de dívida excepcionada pela lei, o imóvel, automaticamente, deve ser reconhecido como impenhorável, independente do valor de mercado.
Diante da decisão, a empresa credora interpôs recurso.
Ao apreciar o caso, o desembargador Castro Figliolia, relator, observou que a mulher reside no imóvel penhorado desde antes da constrição, “o que faz com que se qualifique efetivamente como bem de família”.
No entanto, o magistrado verificou que o imóvel em questão é avaliado em mais de R$ 4 milhões. Para ele, a conclusão trazida pela sentença “acaba por permitir que a proteção legal ao bem de família seja desvirtuada de modo a servir de blindagem de grandes patrimônios”, de modo a garantir que imóveis de elevado valor permaneçam intocados, em detrimento da satisfação da dívida do credor.
Portanto, o colegiado suscitou que a solução aplicável ao conflito seria que o imóvel de alto valor, ainda que reconhecido como bem de família, é passível de penhora ou alienação, desde que com a garantia da reserva, ao devedor ou a terceiro meeiro, de parte do valor alcançado, para que seja possível assim, aquisição de outro imóvel, capaz de servir como lar digno, ainda que não tão luxuoso quanto o bem constrito.
“É a dignidade da pessoa humana que deve ser preservada, não a intocabilidade de toda e qualquer moradia, valha o quanto valer.”
Por fim, o colegiado concluiu que a expropriação do bem permitirá a quitação integral do crédito exequendo. A 12ª câmara entendeu que a alienação do bem será capaz de colocar fim à dívida e o valor remanescente propiciará a aquisição de moradia apta a garantir padrão de conforto digno. Observaram que o bem não poderá ser alienado por menos de 80% do valor da avaliação.
Os advogados Fernando Alfredo Paris Marcondes (Paris Marcondes Sociedade de Advogados) e Elvis Rodrigues Afonso atuaram no caso.
Processo: 1094244-02.2017.8.26.0100
Fonte: Migalhas. Acesso em: 16/09/2020.