Os apaixonados pelo futebol, além do amor que sentem pelo time do coração, no mais das vezes, acompanham também o que ocorre no mundo do futebol fora das quatro linhas e, no domingo do Dia das Mães (12/05/2019), na partida entre Vasco da Gama e Santos, pelo Campeonato Brasileiro, uma “premiação” concedida ao goleiro do Vasco da Gama fez emergir alguns justos questionamentos sobre os limites da liberdade de informação.

Antes, se faz necessário recordar que Sidão, ou melhor, Sidney Aparecido Ramos da Silva, saiu de casa aos 14 (quatorze) anos para realizar seu sonho de tornar-se jogador profissional de futebol e, hoje, com 36 (trinta e seis) anos, realizou, com louvor, esse sonho, atuando como goleiro titular do glorioso Vasco da Gama, com passagens por outros grandes clubes do Brasil, como Corinthians, São Paulo, Audax, Juventus, Botafogo, Clube de Taboão da Serra e etc.

Como dito, atualmente Sidão defende o Vasco da Gama e, no jogo ocorrido no último Dia das Mães (12/05/2019), infelizmente, não teve um bom desempenho, algo perfeitamente compreensível quando tratamos de uma partida de futebol, ainda mais na ingrata posição escolhida por Sidão.

Pois bem, mesmo após levar 03 (três) gols e ter um desempenho abaixo do de costume, Sidão foi eleito, em uma “brincadeira” criada pela maior emissora de televisão do Brasil para homenagear o melhor jogador de determinadas partidas, como o “Craque do Jogo”, em votação ocorrida pela internet.

Ao receber a “premiação”, em rede nacional, é nítida a surpresa e o indisfarçável constrangimento do atleta e, também, da repórter da emissora de televisão encarregada de entregar referido “prêmio” a Sidão.

Com efeito, o quadro televiso “Craque do Jogo”, por tratar-se de uma “brincadeira” de interação da emissora de televisão com seus telespectadores, ao perceber a ocorrência de um claro desvio em sua finalidade de premiar o melhor atleta em campo, poderia/deveria a emissora ter demostrado alguma empatia ao atleta “homenageado” pelo público e ter suspendido a premiação daquela partida ou mesmo ter entregue o prêmio ao segundo mais votado, conforme sua autonomia, entretanto, infelizmente preferiu dar sequência a premiação, ignorando eventuais efeitos nefastos que dela poderiam irradiar ao atleta, no mais famoso estilo “segue o jogo”.

A “brincadeira” levada a efeito pelo pela maior emissora de televisão do Brasil, além de ofensiva, constrangedora e humilhante, denegriu publicamente a imagem de Sidão, inexistindo qualquer direito a informação que, minimamente, justifique a manutenção da brincadeira até seus ulteriores termos.

Como sabido, o direito de uma pessoa acaba quando começa o direito das outras, assim o direito de informar conferido a emissora de televisão deve ser explorado com grande responsabilidade, respeito as pessoas envolvidas, bom senso e ética, sob pena de acarretar, conforme narrado aqui, em desnecessária ofensa à dignidade e honra de terceiros.

Note-se, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é entendido como valor supremo do ordenamento jurídico pátrio, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, princípio basilar de todos os demais direito, porém seu conceito carece, propositalmente, de definição estática, abrangendo, no entanto, o direto de todos a terem uma existência digna, com irrestrito respeito a sua integridade física, psíquica, pensamentos, ações e comportamentos, imagem, honra, vida, intimidade, saúde e escolhas.

Nesse sentido, ao sujeitar o atleta a uma “premiação” que sabidamente não espelhava a realidade da partida e, pior, que prestou-se apenas para expor o Sidão ao ridículo, inconteste que a emissora de televisão que vinculou referida “brincadeira” extrapolou em sua liberdade de informação.

No mesmo norte, lapidar a lição de Pedro Frederico Caldas (1997, p. 65):  “A ampla liberdade de informação deve swer entendida cum grano salis. Não implica salvo conduto para que o veículo de informação agrida impunemente a outrem.”

A conduta narrada além de atingir a honra e a dignidade de Sidão, configura nítido abuso de direito da emissora de televisão que concedeu a premiação a Sidão, abuso esse que, lamentavelmente, todos que votaram, diga-se, de forma jocosa, em Sidão como Craque do Jogo são coautores.

A exposição de Sidão ao ridículo na maior emissora de televisão, para fins comerciais, também malferiu a honra e imagem do Atleta, com potencial, inclusive, de lhe acarretar expressivo prejuízo financeiro, posto que nenhum patrocinador quer vincular o nome e/ou imagem de seu produto e/ou marca a uma situação vexatória.

O todo quanto narrado tem por objetivo trazer a reflexão as atitudes que, sem pensarmos, tomamos em nosso dia-a-dia que podem, eventualmente, magoar e prejudicar terceiros, mormente no conforto do falso anonimato existente no ambiente virtual.

Ainda, a situação supra incita salutar debate quanto aos limites ao direito de informar, nesse sentido.

Por fim, uma reflexão, até que ponto nos é permitido humilhar determinada pessoa/entidade/organização no estéril objetivo de obter-se mais curtidas, seguidores e visualizações em nossas redes sociais?

Sejamos mais solidários!

Este material foi elaborado para fins de informação e debate e não deve ser considerada uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

Ana Camila Freire (ana.freire@gomesaltimari.com.br).

Caio Pinheiro Garcia de Oliveira  (caio.oliveira@gomesaltimari.com.br).

Referências:

ALMEIDA, Pedro Ivo. Sidão é eleito “craque do jogo” com 90% dos votos, e troféu gera climão. UOL Esporte. São Paulo. 12 maio 2019. Disponível em:  https://uolesportevetv.blogosfera.uol.com.br/2019/05/12/sidao-e-eleito-craque-do-jogo-com-90-dos-votos-e-trofeu-gera-climao/. Acesso em: 19 maio 2019.

BECK, Milton. O desrespeito no trabalho: dentro ou fora de campo. Linekdin.com. 15 maio de 2019. Disponível em: https://www.linkedin.com/pulse/o-desrespeito-trabalho-dentro-ou-fora-de-campo-milton-beck?tck=eml-e-mail_feed_ecosystem-digest_01-. Acesso em: 19 maio 2019.

BRAGA, Thiago. Sidão pode ter reparação na justiça por danos sofridos por prêmio da Globo. Lei em Campo: o canal de direito esportivo. 14 maio 2019. Disponível em: https://www.leiemcampo.com.br/sidao-pode-ter-reparacao-na-justica-por-danos-sofridos-por-premio-da-globo/. Acesso em: 19 maio 2019.

BRASIL. [Constituição (1988]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 19 maio 2019.

CALDAS, Pedro Frederico. Vida privada, liberdade de imprensa e dano moral. São Paulo: Saraiva, 1997.

TRANSFERMARKT. #44 Sidão. Disponível em:  https://www.transfermarkt.pt/sidao/profil/spieler/91953.  Acesso em: 19 maio 2019.

UOL ESPORTE. Assessoria de Sidão repudia Globo por troféu de “craque” a goleiro do Vasco. UOL Esporte. Rio de Janeiro. 12 maio 2019. Disponível em: https://esporte.uol.com.br/futebol/ultimas-noticias/2019/05/12/assessoria-de-sidao-repudia-globo-por-trofeu-de-craque-a-goleiro-do-vasco.htm. Acesso em: 19 maio 2019.