A possibilidade de indenização por danos morais e materiais por abandono afetivo exige detalhada demonstração do ilícito civil (artigo 186 do Código Civil) cujas especificidades ultrapassem o mero dissabor, para que os sentimentos não sejam mercantilizados e para que não se fomente a propositura de ações judiciais motivadas unicamente pelo interesse econômico-financeiro.
Com base nesse entendimento, a 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo negou pedido de indenização por danos morais feita por uma mulher contra seu pai por abandono afetivo.
A autora afirmou que sofre desde criança, porque o pai só a procurou quando ela tinha 13 anos e, mesmo assim, “nunca se preocupou em demonstrar afeto, nem em ajudá-la”. Alegou ainda que o princípio da paternidade responsável não se resume ao cumprimento do dever de assistência material, mas também assistência moral.
A ação foi julgada improcedente em primeiro grau e o recurso da autora também foi negado, por unanimidade, pelo TJ-SP. Segundo o relator, desembargador James Siano, apenas a demonstração de conduta dolosa com potencial efetivo de causar grave prejuízo à sobrevivência da autora quando criança poderia sustentar a pretensão indenizatória.
“Embora admissível o escopo de compensação por danos morais por abandono afetivo da prole, ante a falta de amparo material, tem-se como imprescindível a comprovação do alegado inadimplemento alimentar reiterado por parte do genitor para a configuração do ato ilícito, bem como a correlação entre a conduta dele e a eclosão do dano moral, ou seja, a demonstração do nexo de causalidade”, disse.
No caso dos autos, segundo Siano, o único subsídio apresentado com a inicial foi a cópia de uma ríspida conversa entre pai e filha pelo aplicativo WhatsApp, o que seria insuficiente para condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais.
“O sofrimento psicológico que dá margem ao ressarcimento extrapatrimonial, como forma de lenitivo à dor moral, só pode ser aquele capaz de causar aflição extraordinária à vida da vítima, circunstância aqui não vislumbrada. Apesar do dissabor vivenciado, notadamente, pela relação atual das partes, não se observa sofrimento psicológico excepcional que tenha a autora sofrido quando criança em razão do comportamento de seu genitor”, concluiu.
Processo 1000107-41.2018.8.26.0634
Fonte: Conjur. Acesso em: 25/03/2021.