A instituição financeira não pode ser obrigada à manutenção de um vínculo indefinidamente, em desacordo com sua vontade, pois o direito de contratar e de promover o distrato é inerente ao princípio da autonomia da vontade. Neste cenário, a rescisão unilateral, nos casos em que a lei expressa o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte.
Com base nesse entendimento, a 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo autorizou o Banco do Brasil a encerrar duas contas-corrente em nome da Mercado Bitcoin, uma das maiores corretoras de moedas criptografadas do país. O contrato foi encerrado de forma unilateral pelo banco, o que fez com que a corretora entrasse na Justiça.
Porém, o entendimento da maioria dos desembargadores, em julgamento estendido, foi de que não houve abuso de direito, nem indícios de violação à legislação concorrencial ou mesmo de ofensa à boa-fé. Isso porque, segundo o TJ-SP, a corretora foi avisada com 30 dias de antecedência sobre a decisão administrativa do banco de romper o contrato.
“Não houve, portanto, violação das normas do Bacen (artigo 12, I, da Resolução CMN 2.025/93 e Circular 3.788/2016 do Bacen), pois o encerramento, das contas bancárias ocorreu por justificativa plausível: desinteresse negocial na manutenção das contas”, disse o relator, desembargador Hélio Nogueira. “Não se afigura razoável exigir que uma das partes mantenha um vínculo contratual contra a sua vontade”, completou.
Para o relator, não há como obrigar o Banco do Brasil a atrelar a sua imagem à atividade exercida pela corretora de bitcoins, “não havendo que se falar em violação à boa-fé objetiva (artigo 187 do CC) decorrente do desinteresse comercial”.
Além disso, Nogueira não vislumbrou atos do banco que caracterizassem a limitação ou o impedimento de acesso de novas empresas ao mercado, “sendo certo que autora e ré trabalham em segmentos distintos (inexistência de violação ao inciso III do §3º artigo 36 da Lei 12.529/11)”.
Só haveria infração, conforme o desembargador, se a Mercado Bitcoin fosse impedida de abrir sua própria instituição financeira para não concorrer com o Banco do Brasil no mercado de criptomoedas ou impedida, pelo Banco do Brasil, de abrir contas em outros bancos, para atuação em mesmo mercado, o que não é o caso dos autos.
“Nada há nos autos, ainda, que comprove que o Banco do Brasil concorre com a autora no mercado de criptomoedas (inexistência de ofensa ao inciso IV do §3º artigo 36 da Lei 12.529/11). E ainda que concorresse no mesmo nicho, ainda assim, o encerramento da conta não caracterizaria hipótese do inciso IV, porque a conta serve, em princípio, para recebimento e entrega de valores e tal atividade pode ser realizada por qualquer instituição financeira”, concluiu.
1034225-93.2018.8.26.0100
Fonte: Conjur. Acesso em: 28/11/2019.