Por observar que a empresa ignorou o peso da versão feminina e destacando que não houve prova de conduta irregular, a Vara do Trabalho de Itapetinga (BA) afastou a justa causa aplicada contra uma operária demitida após ter sido abordada em um banheiro com o ex-namorado durante o expediente. A indústria alegava que os dois foram encontrados praticando atos sexuais. A empresa deverá indenizar a mulher em R$ 60 mil.
De acordo com a trabalhadora, em abril de 2022, durante o seu horário de intervalo, ela foi até um pavilhão da indústria para conversar com um colega de trabalho sobre problemas na internet de seu celular. Ela não o encontrou e resolveu usar o banheiro feminino do ambiente. Nisso, o seu ex-companheiro entrou na cabine, segurando a porta e pedindo que ela ficasse em silêncio. Outras mulheres entraram no banheiro, e, assustada, ela permaneceu sem reação.
Momentos depois, seguranças bateram na porta e encontraram eles vestidos e sem praticar nenhum ato libidinoso. O boato de que a mulher estava tendo relações sexuais com o ex no trabalho logo se espalhou pela empresa e pela cidade, inclusive chegando ao atual companheiro da funcionária — também empregado da companhia.
Um dia após o ocorrido, a mulher foi demitida sem ter a oportunidade de ser ouvida e esclarecer o que aconteceu. “Não houve uma apuração cuidadosa, apenas uma suposição maldosa”, alega a trabalhadora, que se diz vítima de uma tentativa desarrazoada de aproximação do seu ex-companheiro. O fato ainda afetou a sua saúde, que se viu abalada após o boato se espalhar por grupos de aplicativos de mensagens e redes sociais, utilizando a imagem dela e fotos de mulheres seminuas escondendo o rosto para induzir que se tratava da operadora.
Voz da mulher
O juiz Antônio Souza Lemos Júnior utilizou o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional da Justiça (CNJ). Para o julgador, o fato de a trabalhadora ter sido encontrada dentro de uma cabine do banheiro feminino com o seu ex não pode ser considerado incontinência de conduta, que seria um “ato de pornografia ou libidinoso”.
Para ele, o fato não é sequer um ato irregular por parte da mulher, mas sim pelo seu ex-companheiro, que entrou em um banheiro destinado às mulheres. Em sua visão, a empresa desconsiderou por completo o peso da versão feminina, e não caberia à operadora provar que não estava praticando conduta ilegal, mas à companhia — o que não aconteceu.
Por esses motivos, o juiz declarou nula a justa causa, declarando que o rompimento do vínculo ocorreu de forma imotivada, por iniciativa do empregador. Além disso, o julgador lembrou que a trabalhadora foi abordada dentro do banheiro por seguranças do sexo masculino e que a situação tornou o fato perceptível por outros empregados, “o que incentivou a disseminação da notícia danosa”.
Na visão do juiz, a indústria acusou sem provas e contribuiu para a divulgação do boato pela falta de zelo na abordagem. “Essa situação foi amplamente divulgada na comunidade por meio de grupos de WhatsApp e de blogs de informação locais.”
O número do processo, bem como os nomes das partes, não foram informados, uma vez que o processo está em segredo de justiça. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-5.
Fonte: CONJUR