Em entrevista exclusiva, o secretário-geral da International Organization for Standardization (ISO), Sergio Mujica, conta sobre as frentes de trabalho hoje e as iniciativas pioneiras do Brasil com a ABNT como parceira.
Em passagem pelo Brasil no início do mês, o secretário-geral da ISO, entidade que padroniza processos e normas técnicas no mundo todo, reforçou em entrevista ao Prática ESG e em encontros com parlamentares e empresários, o protagonismo do país em algumas frentes. Entre elas, Sergio Mujica destaca a agenda ambiental e os impactos das mudanças climáticas nos negócios.
“As mudanças climáticas são prioridade e, ao mesmo tempo, um desafio bem grande, que enfrentamos como humanidade”, diz. Mujica comenta que a organização já abrange em suas normas aspectos ambientais e climáticos, a exemplo da ISO 14001, que determina a revisão de processos organizacionais para criar um sistema de gestão ambiental mais controlado e eficiente. “O que mudou é a sensação de urgência”, completa.
Diante disso, conta, estão sendo feitas revisões no portfólio de normas para contemplar e responder às exigências das urgências climáticas. Isso vale tanto para questões técnicas de produtos, a exemplo, do cimento, como também processos que levem ao status de “net zero”, quando, a partir de um trabalho de longo prazo de redução de poluição e compensações, zera-se as emissões líquidas de gases.
“Fizemos um esforço enorme, mobilizando mais de 1.200 pessoas experientes de mais de cem países, para chegar a um acordo sobre as necessidades e os princípios-guias para o ‘net zero’. Havia um vazio a ser preenchido”, diz Mujica, sobre documento lançado na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP) no ano passado. Diferentemente de outras metodologias da ISO, como ISO 14001 (ambiental), ISO 50001 (energia), ISO 14064 (emissões de gases de efeito estufa), o Net Zero Guidelines não contém obrigações, mas sugestões.
Também na COP de 2022, o Brasil, por meio da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a representante local da ISO, saiu na frente e apresentou uma proposta de regras para empresas e entidades quantificarem, reduzirem e compensarem as emissões de gases de efeito estufa (GEE), a ABNT Prática Recomendada (PR 2060).
Em sustentabilidade, temas como biodiversidade e a economia circular também estão entre as prioridades da ISO para os próximos anos. Na lista de importância, estão ainda igualdade de gênero e a digitalização das normas. No primeiro caso, Mujica acredita que, em questões de gênero, a neutralidade não é suficiente. “Precisamos ter normas que respondam às diferenças de gênero”, diz. Ele cita como exemplo alguns equipamentos de segurança, como o próprio cinto de segurança e capacetes, que não consideram as diferenças físicas entre homens e mulheres.
Em paralelo, o trabalho de digitalizar as 24 mil normas publicadas da entidade visa facilitar a automatização de processos e mensuração da execução das mesmas em tempo real.
A criação de padrões pela ISO é descentralizada. Cada um dos 170 países-membros, por meio de suas entidades parceiras, pode propor aos comitês técnicos normas a serem implantadas em nível nacional e apresentadas aos demais membros internacionais. O Brasil, diz Mujica, está na vanguarda de discussões de frentes importantes.
A ABNT, por exemplo, lançou no fim do ano passado a primeira certificação ESG, com uma série de 42 critérios nos três eixos: ambiental, social e de governança. A proposta se alinha ao padrão ISO 9001, que dita modelo de gestão da qualidade para organizações em geral. “As empresas estão sendo cobradas para apresentarem uma certificação do tipo”, diz o presidente da ABNT, Mario William Esper. “É uma norma complexa, mas a proposta levada à ISO é um texto base para uma norma internacional, no formato de auto verificação, autoavaliação.”
Fonte: VALOR ECONÔMICO