O estudo “Divisões e Dividendos 2023”, produzido pela consultoria Russell Reynolds Associates, identificou que o nível de comprometimento do mundo corporativo com sustentabilidade está aumentando. Prova disso é que 45% dos executivos em posições de liderança disseram que os investimentos na agenda ambiental devem crescer em 2024. Outros 45% vão manter o mesmo orçamento de 2023 e apenas 7% pretendem reduzir esses esforços. Para a pesquisa foram ouvidos 3.813 líderes sêniores e 8.753 colaboradores de empresas em 104 países das Américas, Ásia, Europa e Oceania.
Dos respondentes, 83% afirmaram que já estão desenvolvendo planos específicos em resposta a questões regulatórias e a pauta trabalhista é motivo de atenção de 78% deles. No radar, estão ainda regulação de emissões de gases de efeito estufa (GEE), diversidade étnica, regras de atendimento ao consumidor, direitos humanos e outras demandas, que variam por país e setor de atuação.
Tanto os temas sociais quanto os ambientais estão no radar, sendo apontados como alvo de investimentos e esforços por 74% e 70% deles. Segundo Tatyana Freitas, líder da prática de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) e ESG da consultoria especializada em desenvolvimento de lideranças Russell Reynolds Associates, a pauta social está tão presente nas discussões quanto as demais e é igualmente relevante para o avanço da agenda ESG (sigla em inglês para questões ambientais, sociais e de governança corporativa) nas empresas. “O que muda é a demanda de cada empresa, variando de acordo com o estágio de maturidade das questões de ESG e pressão dos stakeholders”, diz.
Na opinião de Freitas quem, de fato, puxa a agenda ESG nas empresas são clientes e investidores, mais até do que o arcabouço legal existente em alguns mercados. “Em geral, a legislação sobre práticas ESG ainda é tímida e não reflete o nível da discussão na sociedade, nos meios acadêmico, científico, corporativo, entre líderes de opinião, que é muito mais avançada”, diz.
Brasil
Executivos brasileiros se destacam globalmente, com respostas 15 pontos percentuais acima da média global em diversos aspectos. A pesquisa revela que os líderes no Brasil veem seus CEOs como mais comprometidos com a agenda sustentável e desenvolveram planos concretos para lidar com questões ambientais, trabalhistas, regulatórias e sociais. Pelo Brasil ser mais ‘cobrado’ em nível global em relação à preservação do meio ambiente, segundo Freitas, é natural que as empresas fiquem mais atentas a esse aspecto na hora de montar planos de ações.
“O fato de 91% dos entrevistados brasileiros perceberem seus CEOs mais envolvidos com a agenda indica uma tendência de que a pauta está na mesa, o assunto faz parte das preocupações dos líderes executivos e eles aparentemente estão conseguindo transmitir melhor isso para seus times”, comenta Freitas.
Oportunidades e obstáculos
Enquanto líderes globais expressam compromissos com a agenda de sustentabilidade, há, porém, lacunas importantes na forma de gerir a equipe e as operações que requer atenção estratégica para que os planos sejam traduzidos em ações efetivas.
A Russell Reynolds identificou no relatório alguns caminhos para que os líderes se envolvam na agenda ESG e tragam, com isso, resultados positivos para os negócios. Para alcançar os objetivos, foram elencadas quatro lacunas críticas no pensamento e na capacidade de liderança: mentalidade disruptiva, motivação, responsabilização e mobilização.
A mentalidade disruptiva é crucial para orientar organizações em direção a um futuro sustentável e quase três quartos (76%) dos líderes relataram que seus CEOs estão pessoalmente comprometidos com as práticas sustentáveis. Contudo, só metade acredita que eles estão impulsionando a inovação necessária e faz investimentos ousados para transformar suas empresas.
“Sem uma liderança com mentalidade inovadora e metas ambiciosas, a agenda avança mais lentamente que o ideal”, ressalta Freitas. Para ela, a mudança se dá com maior entendimento da relevância do tema e do seu impacto para o negócio, com aprovação de investimentos cada vez mais alinhados com os objetos em ESG e com maior cobrança da sociedade, dos investidores. Entre os atributos importantes para os futuros líderes, a consultoria, em seu trabalho de desenvolvimento de profissionais, busca: pensamento sistêmico multinível, inclusão de stakeholders, inovação disruptiva e orientação de longo prazo.
A motivação também importa. A pesquisa ainda trouxe que boa parte dos líderes veem a sustentabilidade como um exercício de construção de marca e não uma verdadeira alavanca para o desempenho do negócio. Apesar de 96% reconhecerem o impacto da sustentabilidade nos negócios a longo prazo, apenas 21% citam o lucro maior entre os benefícios das ações sustentáveis.
Freitas comenta que a construção de marca pautada pela sustentabilidade é relevante, mas é apenas o primeiro passo de uma longa jornada e quem prioriza esse aspecto ainda está em uma fase inicial da aplicação da agenda ESG.
“Sustentabilidade é um tema irreversível e é preciso enxergá-la como uma oportunidade de criação de valor para os negócios e a comunidade para integrá-la nas práticas diárias e impulsionar a sobrevivência no longo prazo”, comenta a executiva da consultoria.
Ela cita como exemplo a inclusão, na própria Russell, da mentalidade sustentável como critério na busca de executivos para seus clientes, independentemente da posição e área de atuação. A ideia, diz, é avaliar justamente o potencial de futuros diretores para lidar com os desafios e as oportunidades em sustentabilidade.
Outra lacuna identificada pela pesquisa da Russell Reynolds é a da responsabilização, ou seja, da inclusão, por parte dos líderes, da sustentabilidade em suas tarefas diárias e metas. Embora haja um aumento de 19% no número de executivos C-level com remuneração vinculada a resultados em ESG (ambientais, sociais e de governança) nos últimos dois anos, apenas 32% têm critérios de sustentabilidade em avaliações de desempenho e 23% mensuram seus objetivos por meio de KPIs (Indicadores-Chave de Desempenho) claros.
“Estabelecer metas em ESG por área e responsabilizar a liderança pelos resultados ajuda a imprimir velocidade na evolução da agenda. Lembrando que essa é uma jornada e que inclui muitos stakeholders, mas que no final das contas, tangibiliza os objetivos com ações do dia a dia”, pontua a executiva.
Por fim, na questão do engajamento, o estudo identificou que 63% dos executivos se dizem motivados para encontrar formas de melhorar a sustentabilidade da organização, uma boa notícia. Mas, o percentual de quem se sente empoderado(a) para criar e testar soluções sustentáveis, é menor: 57%. E pior: apenas 10% discutem frequentemente os objetivos sustentáveis com o seu gestor. A conclusão é de que os líderes precisam trazer mais as equipes para perto dessa jornada.