Quais as principais mudanças, os maiores desafios e as oportunidades causados pela pandemia de Covid-19 na Governança Corporativa? Foi partindo dessa questão que especialistas consagrados no tema se reuniram no último dia 23 de junho, em evento do IBGC, para melhor compreender o cenário atual e as nuances que aguardam as companhias no futuro.
O debate titulado “Governança em um mundo pós pandemia” evidenciou que um dos temas que mais se sobressaíram nos conselhos das empresas durante o período de crise – apesar de se tratar de um período ainda não superado – foi o da resiliência corporativa. Isso porque, houve uma grande revolução na capacidade das organizações de se mobilizarem para tolerar, superar, e se desenvolver diante de um período sem precedentes que desafiou a todo momento o comportamento humano. E, consequentemente, as mudanças começaram a surgir.
Mudança de mindset, conteúdo e formas de trabalho
Celso Ienaga, sócio principal na Dextron Consulting e professor do Curso de Formação de Conselheiros do IBGC, contou que, a partir desta capacidade de resiliência entre conselhos e gestores executivos para o enfrentamento da situação de crise, foi possível notar três mudanças importantes. A primeira no mindset corporativo, a segunda em seu conteúdo e a terceira nas formas de trabalho.
Para Ienaga, o mindset se tornou mais aberto e mais permeável às propostas e opções diferentes. “Ou seja, o board se tornou mais adaptável e houve o aumento da amplitude da consciência. Passamos não só a olhar para os próprios negócios, mas para todo o ecossistema e stakeholders como um todo. Os temas a serem debatidos dentro dos conselhos alcançaram uma amplitude maior”, ponderou.
Ao mesmo tempo, esses conteúdos se diversificaram com foco maior no futuro. Antes as pautas se concentravam mais nas questões de risco e, atualmente, passaram a ser mais sobre oportunidades em meio à crise, bem como na tomada de decisão mais ágil. Para o especialista, muitas companhias sofreram profundamente com a Covid-19, mas muitas delas souberam aproveitar este momento da pandemia para capturar oportunidades de crescimento e isso exigiu discussões mais estruturadas e focadas.
“A temática da inovação, por exemplo, que era eventual, surgiu de forma muito proeminente pós-covid. Hoje, questões relacionadas à inovação se tornaram quase que pautas permanentes nas discussões”, exemplificou Ienaga. Quanto às formas de trabalhar, o período pandêmico também desafiou o formato das agendas dos conselhos que, agora, estão cada vez mais flexíveis. “Da para fazer mais coisas a distância e, ao mesmo tempo, os eventos vêm acontecendo em uma velocidade que a nossa agenda fica pulverizada. Aquela tradicional reunião de um dia se tornou quatro reuniões de duas horas espalhadas pelo mês”, pontuou.
Mais humildade e oportunidade para novas habilidades
Leila Loria, Presidente do Conselho de Administração do IBGC e palestrante do debate, discorreu sobre a ampliação das agendas dos conselhos, mas antes alertou para a mudança de relacionamento entre conselheiros e executivos e para a humildade que envolveu as ações prontamente.
“O início do processo foi muito interessante, pois destacou o quanto a humildade foi importante. Nem o conselho, nem o grupo executivo sabia muito bem o que ia fazer e o que ia acontecer e isso fez com que a gente se aproximasse muito das equipes de gestão. Ao longo do tempo, a gente foi gerenciando riscos e oportunidades e foi chegando a algumas ações. Mas essa humildade acredito que ficará para sempre. O conselho está mais próximo do mundo executivo”, descreveu a especialista.
Nesta direção de transformações, Leila também falou sobre a relevância dos aspectos comportamentais para os conselhos. Para ela, esses aspectos – ora de soft skills ou essential skills – são considerados há muito tempo como importantes, mas neste momento de pandemia, tendo em vista também que a agenda dos conselhos mudou, se tornaram mais relevantes, porque o conselho tem características distintas.
“O conselho é um sistema social, é mais que um grupo, que precisa ter uma diversidade de perfis, de competências, de expertises. Ter conselheiros que estão ali para construir uma melhor decisão para a companhia em conjunto e não de maneira individual se tornou muito importante”, descreveu Leila.
Conselhos do Futuro
Ao mesmo tempo, nem tudo o que se tem visto ao longo do período de pandemia são ações novas. Alguns planos e iniciativas sempre estiveram presentes no dia a dia das companhias. Mas como pontuou Leila é importante esclarecer que foram práticas aceleradas. Foi o caso da pauta Environmental, social and corporate governance (ESG) e o tema da transformação digital. “Aquilo que ia levar dez anos, realmente passou a levar menos tempo. A gestão de risco também passou a ser mais associada às oportunidades de transformação digital”, acrescentou a especialista.
Em virtude desta aceleração e da própria volatilidade dos processos – características mais robustas na pandemia – discutir os conselhos do futuro é prioridade. O IBGC já vinha tendo um debate sobre isso, pois, apesar de novos temas terem sido inseridos nas agendas dos conselhos, os que já estavam lá permaneceram. Por exemplo, os temas de controle, de acompanhamento, de compliance, entre outros temas estratégicos de monitoramento.
Inclusive, considerando esta complexidade, o IBGC lançou ao final de 2020 a “Agenda Positiva” que tem por intenção aprofundar a discussão sobre esses temas e muitos outros, além de favorecer a integração de muitos pilares como ética, integridade, inovação e transformação digital. Foi neste contexto que também foi criada a Comissão Temática, denominada Conselhos do Futuro, no IBGC.
Daqui pra frente
Ao final do evento, os especialistas puderam responder perguntas da audiência e dos moderadores Janete Anelli, diretora da AW3, e Marcelo M. Bertoldi, sócio da Marins Bertoldi Advogados. Do ponto de vista de competências a serem desenvolvidas daqui para frente nos conselhos, Celso comentou que temos que aprender a fazer muitas perguntas. “Essa realidade demanda de nós a capacidade de fazer perguntas. E não dá para chegar na pergunta certa, sem fazer várias perguntas antes. Nunca antes tivemos que aprender a aprender. Aprender para aprender. Vamos ter que estar neste movimento”, esclareceu.
Leila, por sua vez, completou que neste momento em que temos que aprender a reaprender, fazer muitas perguntas, estar aberto para o novo e ter muito “desconhecido”, construir um conselho mais diverso, com diferentes experiências e diferentes perfis, de uma forma muito mais ampla, ajuda no processo de inclusão de novas ideias. “A diversidade sozinha sem inclusão também não resolve. Porque precisamos criar um ambiente inclusivo em que todos têm a humildade de construir juntos”, finalizou.
Fonte: IBGC. Acesso em: 01/07/2021.